Vejam a resenha semanal da conjuntura politica no Brasil "O PONTO" - 23/11/18
Olá,
a formação do novo governo segue um padrão em meio ao caos proposital: Paulo Guedes mostra força e traz nomes de confiança para implementar uma agenda privatizações, enquanto Bolsonaro segue indicando ministros alinhados ao conservadorismo conspiratório e aos lobbies empresariais. Se Bolsonaro - ainda - age por fora do sistema político, o sistema financeiro está vindo de mala e cuia.
Todos os compromissos do Presidente. A cada nome anunciado para compor o futuro governo, é natural que as atenções se dirijam ao currículo de cada um. Porém, cada escolha de Bolsonaro também revela com quem são seus compromissos, quais setores serão contemplados e por onde vai este governo. Começando pela turma dos Chicago Boys, os economistas formados pela escola liberal da Universidade de Chicago, que gostam de uma liberdade para o mercado mas preferem autoritarismo na política. É de lá que saiu o superministro Paulo Guedes e o presidente do BNDES Joaquim Lewy. E também o novo presidente da Petrobrás Roberto Castello Branco e do Banco do Brasil Rubem de Freitas Novaes. Paulo Guedes, aliás, segue mostrando força ao indicar todos os nomes para os cargos-chave. O repertório do grupo é simples, como comprovam os planos para Petrobrás: privatização de áreas da empresa e preços atrelados ao mercado internacional. Além da petroleira, bancos estatais também devem entrar na mira da nova secretaria de privatizações. Falando nisso: Bolsonaro vai receber de Temer um pacote de projetos de concessão, prontos para serem leiloados já no primeiro trimestre do ano que vem, incluindo 12 aeroportos, quatro portos e uma ferrovia. A solução é vender o Brasil.
A terceira força central do governo devem ser as forças armadas, em sua versão mais conservadora, mas também revanchista, como revela o anúncio do general Maynard Marques de Santa Rosa para a Comissão de Transição. Maynard foi exonerado no governo Lula por ter criticado a Comissão da Verdade.
Na área da Educação, Bolsonaro atendeu às pressões da bancada evangélica, que não gostou do nome de Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna. No seu lugar, foi indicado o colombiano naturalizado brasileiro Ricardo Velez Rodriguez, adepto do Escola Sem Partido e defensor, entre outras coisas, que as escolas comemorem o golpe militar. A exemplo do ministro das Relações Exteriores, o da Educação também está na “cota pessoal” de Olavo de Carvalho, guru da extrema-direita brasileira. Como aponta Bernardo Mello Franco, o que era uma piada nos porões da internet virou doutrina oficial do novo governo federal.
Nota-se um padrão. A despeito da figura tosca de Bolsonaro e da cacofonia muitas vezes proposital do novo governo, é possível observar um padrão nas indicações. O que antes era lobby e pressão política, no caso da economia, passa a ocupar cargos no núcleo do poder,como apontam especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato. Outro padrão diz respeito às indicações por fora dos partidos, embora muitas delas contemplem partidos tradicionais, o que gera um leve ruído com seu principal aliado, o DEM, e um certo ciúmes do partido do próprio presidente eleito. Interessante observar que alguns dos ministros indicados e nomes fortes do novo governo estão aderindo ao Twitter, transformado em “Diário Oficial” por Bolsonaro na sua estratégia de comunicação direta com a população. Além disso, como aponta o jornalista Gilberto Maringoni: há método no caos. Resta saber como se comportará um governo formado por grupos autônomos (militares, lavajatistas, postoipiranguistas), mas ninguém esqueça que há apoio forte para que o governo “dê certo” no que se propõe. Um exemplo: o assessor de Segurança da Casa Branca, John Bolton, confirmou que vem ao Brasil na semana que vem, como prova do prestígio que Bolsonaro angariou com o governo Trump.
RADAR
Mais Médicos. O caso da retirada dos médicos cubanos mostra bastante do que virá daqui pra frente, não só no que diz respeito ao alinhamento aos EUA e às pautas paranoicas e conservadoras, mas às estratégias de comunicação. Bolsonaro, que já havia mentido sobre a presença de familiares dos médicos, disse na terça (20) que os profissionais que já deixaram o Brasil são militares e agentes infiltrados. Não é a primeira vez que ele mente sobre a qualificação dos médicos. O Ministério da Saúde lançou edital emergencial para médicos brasileiros, que recebeu mais de 11 mil inscrições, porém só a metade foi efetivada. O sistema, aliás, chegou a receber um milhão de acessos simultâneos, “característico de ataques cibernéticos” conforme o próprio ministério. Sobre a importância do programa, vale ler: o Mais Médicos reduziu consideravelmente o número de internações. Mas a imprensa também publicou reportagens críticas, como no caso do médico cubano que se disse explorado e dos telegramas que revelariam que a ideia partiu de Cuba, o que teve resposta do ex-ministro Alexandre Padilha.
Escola Sem Partido. Quem esperava que o STF desse fim à sandice da perseguição ideológica nas escolas, pode começar a repensar. O ministro Dias Toffoli não deve colocar o projeto em pauta na próxima quarta (28) e dá sinais de que não pretende encarar temas polêmicos no início de seu mandato como presidente do STF. Atenção também para o movimento de membros do Ministério Público em favor do projeto: a “nota técnica” divulgada por este grupo é uma cópia de um parecer do idealizador do Escola Sem Partido. Tudo em casa.
Pré-sal. O presidente do Senado se reuniu nesta semana com representantes do governo eleito para discutir o projeto que autoriza a Petrobras a negociar parte da exploração de petróleo no pré-sal com empresas privadas. Na saída da reunião, disse que colocará a cessão onerosa do pré-sal em votação depois que for fechado um acordo para que estados e municípios também recebam parte dos recursos que serão arrecadados. O PLC autoriza a Petrobras a transferir a petroleiras privadas até 70% de seus direitos de exploração de petróleo na área do pré-sal.
Direitos trabalhistas. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) suspendeu por 90 dias a tramitação do processo que trataria pela, primeira vez, se o negociado prevalece sobre o legislado, conforme prevê a reforma trabalhista. Em audiência realizada na quarta (21), a relatora deu prazo para que sindicatos patronais e de trabalhadores da área da aviação, envolvidos no caso, cheguem a um acordo sobre as cotas mínimas de contratação de aprendizes e de pessoas com deficiência pelas empresas do setor. Se não houver acordo no prazo, o processo vai a julgamento.
VOCÊ VIU?
Ministério Público sem partido. Na semana que vem, a Fundação Escola Superior do Ministério Público (MP) do Distrito Federal sediará dois dias de palestras com temas que parecem extraídos do discurso de Bolsonaro. O “curso de bolsonarismo”, como chamou o BuzzFeed, debaterá temas curiosos, como “a estatística a serviço da ideologia”. Falando nisso, o presidente do TRF-4, Thompson Flores, participa nesta sexta (23) de um colóquio com representantes do bolsonarismo.
Barragens. Relatório da Agência Nacional de Águas (ANA) aponta que aumentou de 25 barragens, em 2016, para 45 em 2017 o número de áreas com risco de desabamento no país. A maioria está localizada no Norte e Nordeste. Em tempo: a reportagem é da Agência Brasil, ameaçada pelo governo eleito.
BOA LEITURA
Sandálias da humildade. Dois textos convidam a esquerda a se repensar com menos arrogância e tentando entender as mudanças no mundo do trabalho. Tanto Leonardo Sakamoto quanto Henrique Costa batem nas mesmas teclas: a esquerda não entende o trabalhador precarizado e as pautas dos anos 80 já não fazem sentido.
Colapso. No El País, Marcos Nobre diz que apostar na autodestruição do governo só imobiliza as forças democráticas e, ainda, que o futuro governo precisa que o sistema político permaneça colapsado.
Polônia. Uma sociedade polarizada, um governo autoritário que estimula a perseguição religiosa, ataca a imprensa e se alimenta de teorias conspiratórias. A jornalista Anne Applebaum conta o que acontece na Polônia.
Globalismo II. O jornalista Denis R. Burgierman explica a relação entre os incêndios na Califórnia, os irmãos petroleiros Koch e as ideias do novo chanceler brasileiro.
Artificial. Pouca coisa na internet hoje é espontânea e a maior parte do conteúdo da rede são campanhas, diz o especialista em redes sociais P.W. Singer. Para Singer, Facebook e Twitter são omissos em combater a manipulação eleitoral porque se beneficiam como empresas.
Ideologia de gênero. A pesquisadora norte-americana Amy Erica Smith analisa o comportamento de eleitores e parlamentares evangélicos no Brasil. Movidos por valores, a questão central para este grupo é combater a “ideologia de gênero”.
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